terça-feira, 26 de novembro de 2013

Maternidade

A vida às vezes nos brinda com momentos absolutamente sublimes. Esse aconteceu outro dia. Um dia qualquer, que não merece qualquer distinção, como tantos outros que se passam todos os dias.

Hora do almoço, Metrô relativamente cheio e um calor infernal. O Rio de Janeiro ultimamente me parece com uma vontade abissal de se candidatar a ser um emirado desses da vida. Um sol incidente, preços exorbitantes e ostentação sem limites. Os mais esnobes diriam que o Rio anda se sentindo a última Coca Cola do deserto. Eu fico com a opinião que ele tem certeza que é o deserto que tem a última Coca Cola. Inclusive já comentam que esse é o carro chefe da candidatura da cidade a emirado, com direito a patrocínio, urso polar de sunga, Papai Noel de tanga e tudo o que mais que lhe for de direito.

Enfim, voltemos ao metrô. O vagão quase tomado, bancos mais disputados que água no deserto e eis que entra uma mãe com seu carrinho de bebê. Movimentação. Uns mexem com a criança, outros oferecem o lugar, mulheres abraçam seus maridos e lugares magicamente vagam para que a jovem mãe possa se sentar.

Numa dessas curiosidades que a vida faz questão de apresentar, o lugar que ela escolheu era exatamente ao lado de uma grávida. Que momento lindo.

Talvez atraída como um imã pelo instinto maternal de outra semelhante, a mãe se assenta em seu lugar e começa a brincar com a criança, acompanhada da vó. Diriam alguns, tocados pela situação:
- Olha que lindo! Passado, presente e futuro, juntos em um só momento.

A vó pede para criança falar vovó, a mãe pede para criança falar mamãe, a moça ao lado da vó dá “tchauzinho” e alheio a isso tudo, o moleque só solta um “bá”. É ou não é lindo?

Ao lado de toda essa comoção, a jovem grávida acaricia sua barriga e olha com ternura para o carrinho. Murmura algumas palavras, seus olhos enchem d’água e a criança sorri para ela. É, definitivamente é lindo.

E o momento sublime se estende como uma leve pluma que paira no ar. A mãe e a vó brincam com a criança, outros passageiros observam a cena com um sorriso no rosto, a grávida acaricia cada vez mais a barriga e olha com toda a compaixão do mundo. Se um teste fosse feito naquele momento, atestaria sem dúvidas que 93% das mulheres presentes naquele vagão ovularam ao ver a cena.

Já me pegava imaginando o que a gravida estava a pensar, o que diria ao seu futuro filho, os planos que ela fazia para quando a criança nascesse quando de repente, e não mais que de repente, pois nada na vida é tão de repente assim, o vagão deu uma parada brusca, daquelas que o locutor informa “O Metrô Rio pede desculpas pela parada brusca”, e o carrinho deu uma forte sacolejada.

A mãe se projetou para frente para proteger a prole, a vó se segurou no assento, alguns passageiros se ajustaram como em um carro de bois e o moleque, o moleque é claro que chorou.

Alto, estridente, incessante e sem respirar. Choro daqueles que dá dó ver a criança se esgoelando sem nada poder fazer. Todos no vagão fizeram cara de pena e se ofereceram para ajudar, a grande maioria não mais que em suas mentes.

E a jovem grávida, bom, a jovem grávida fez cara de “sem paciência”, deu uma coçada no ouvido como quem tenta desentupi-lo depois de uma explosão nuclear, levantou do assento absolutamente exausta da situação e saiu na próxima estação.


Até porque o filho era da outra, cada um cuida do seu e ela já tem bastante trabalho para cuidar do dela que ainda nem chegou. Sem contar que aquela criança nem era aquela Coca Cola toda.

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